‘Não sou líder criminos, sou empresário’, diz o médico Mouhamad Mustafa, acusado de desviar recursos da Saúde

'Não sou líder criminos, sou empresário', diz o médico Mouhamad Mustafa, acusado de desviar recursos da Saúde

Amazonaas – O médico Mouhamad Mustafa, apontado como chefe de uma organização criminosa que desviou recursos do sistema de saúde pública do Amazonas, negou durante audiência na Justiça Federal, nesta sexta-feira (17), ter envolvimento com esquema criminoso.

“Não sou líder, não formei organização e nem liderava organização criminosa. Não sou chefe de organização. Eu sou empresário”, disse o médico.

As fraudes foram apontadas durante a Operação “Maus Caminhos“. O montante desviado, segundo a denúncia, ultrapassa R$ 221 milhões. O dinheiro era utilizado na aquisição de bens de alto padrão, como avião a jato e shows particulares de bandas famosas no país.

A audiência de interrogatório de réus no processo ocorre no auditório da Justiça Federal, em Manaus, e é conduzida pela juíza da 4ª. Vara Federal Ana Paula Serizawa Silva Podedwony.

O médico chegou à sede da Justiça Federal antes das 7h. Nesta etapa, são ouvidos, na condição de réus do processo 41-09.2017.4.01.3200, Mouhamad Moustafa, Alessandro Viriato Pacheco, Jennifer Nayiara Yochabel Rufino Corrêa da Silva e Priscila Marcolino Coutinho.

Na primeira parte da audiência, o médico foi questionado sobre a ligação dele com o contador Gilmar Fernandes, Antônio de Melo Marques, seu amigo de infância que seria utilizado como laranja, e um coronel da Polícia Militar, todos citados no processo. Foram cerca de 1h30 de questionamentos.

Mouhamad Mustafa confirmou amizade com Antônio, mas negou que ele fosse seu laranja. O médico disse que Antônio fazia serviço para família dele e era uma pessoa de confiança. Questionado sobre depósitos de dinheiro feitos ao amigo, o médico confirmou as transferências.

O médico também foi questionado sobre porte de arma. Mouhamad declarou que andava armado somente quando tinha porte de arma, mas que atualmente só tinha posse de arma.

Mustafa confirmou, ainda, que recebia escolta de policiais. Ele disse que contratava PMs que faziam serviços extras. A juíza questionou o motivo de ele não contratar uma empresa especializada para fazer a sua segurança, mas o médico disse que temia ser roubado.

O acusado confirmou que um coronel da Polícia Militar chefiava a contratação da escolta armada de PMs e que o coronel organizava os profissionais em escala trabalho desde 2015.

Com relação ao giroflex encontrado, durante a operação, em um de seus veículos, o réu afirmou que usava o alarme para chegar em shows que promovia, com o objetivo de facilitar o acesso a esses locais.

Em relação à denúncia sobre a atuação dele junto a secretarias do Governo do Amazonas, como Casa Civil, Susam e Sefaz, para liberar pagamentos para as empresas de propriedade dele e para a organização social (Instituto Novos Caminhos), o médico negou qualquer prática ilícita.

O médico também negou manter lobby com secretários para receber vantagens.

“Não era uma atuação, porque havia contrato e o estado deveria pagar, mas diante da crise esses pagamentos não eram feitos como deveriam. Havia uma romaria de empresários que procurava as secretarias para receber pagamentos de que era de direito”, disse.

A Justiça também questionou o médico sobre a relação dele com Priscila Marcolino Coutinho, sócia de uma de suas empresas e ré no processo. Ele afirmou que Priscila era responsável pela parte financeira. Ao ser interrogada no dia 14, ela não respondeu a nenhuma pergunta e se reservou ao direito de permanecer calada.

A Justiça citou auditório da Controladoria-Geral da União (CGU) que identificou obstrução e tentativa de esconder provas de desvio de verbas, e que o médico teria orientado a Priscila a dar fim em supostas provas. O médico também negou.

Com relação à denúncia de ter algemado e torturado o contador Gilmar Fernandes durante um encontro, o médico negou a situação, mas confirmou que havia policiais no local da reunião. De acordo com a denúncia, o contador do grupo tinha se apropriado de recursos com inserção de funcionários fantasmas na folha de pagamento da empresa Salvare.

Ainda durante a audiência de interrogatório, o médico disse que tomou conhecimento de um desvio de cerca R$ 600 mil depois que a enfermeira Jennifer Nayiara Yochabel Rufino Corrêa da Silva e Prinscila fizeram, segundo ele, investigação e identificaram um esquema que teria sido feito por Gilmar. Elas teriam começado a desconfiar do contador depois da mudança do estilo de vida dele e da família.

De acordo com ele, o contador estaria desviando recursos junto a outro funcionário identificado como André. Os desvios eram feitos por meio das folhas de pagamento. Com esse dinheiro, ele teria construído uma mansão em Manaus.

“A Jennifer me contou que ele (Gilmar) tinha construído uma mansão no meio da favela. Ela chegou a dizer que a piscina dele era maior do que a minha. Apesar de que isso não importa porque eu só queria uma piscina pequena para brincar com meus filhos”, disse Mouhamad Mustafa

Após a descoberta do desvio por parte dos funcionários, o médico disse que demitiu os dois com todos os direitos trabalhistas. Mustafa disse, ainda, acreditar que Jennifer atuava no esquema, mas disse não ter provas.

Na audiência, o Ministério Público disse ter identificado movimentação de R$ 40 milhões. O médico foi questionado de que forma esse valor foi aplicado. O réu afirmou que foram feitos pagamentos a fornecedores principalmente no setor de ambulância.

No fim do interrogatório, o médico chorou e chegou a pedir para aguardar o processo em liberdade. A juíza disse que não poderia atender ao pedido já que a defesa há havia entrado com habeas corpus no Tribunal de Justiça. O pedido está em análise.

Denúncias

Ao todo, 16 pessoas são acusadas de envolvimento no esquema de desvio de recursos do sistema de saúde pública do estado. Entre os presos estão: Alessandri Viriato Pacheco, Antônio de Melo Marques, Davi de Azevedo Flores, Erhard Lang, Gilberto de Souza Aguiar, Jennifer Naiyara Yochabel Rufino Correa da Silva, Marcia Alessandra Sulva do Nascimento, Mouhamad Moustaf, Pablo Gntzmann Pereira, Pauline Azevedo Sá Campos, Priscila Marcolino Coutinho e Rodrigo Fernandes Arol.

Dailson Marciel de Jesus, Euler de Paula Baumgratz, Gilmar Fernanres Correa e Paulo Roberto Bernardi Galaci não estão presos.

De acordo com o MPF, todos foram acusados de integrar a organização criminosa e as penas podem chegar a até 12 anos. Parte dos acusados também foi denunciada por embaraçar as investigações, podendo pegar pena de até 20 anos por conta dos crimes.

Depoimentos

A primeira a ser ouvida pela Justiça Federal foi a enfermeira Jennifer Nayiara Yochabel Rufino Corrêa da Silva, que aceitou participar a delação premiada.

Ela disse que se tornou presidente do Instituto Novos Caminhos porque era ameaçada pelo médico Mouhamed Mustafa, mas que não tinha poder de decisão. Ela confirmou ainda o fornecimento de medicamentos com valores acima e a quantidade inferior que na nota fiscal.

Durante a tarde foi a vez do empresário Alessandro Viriato Pacheco ser ouvido pela Justiça. Ele era sócio de uma das empresas fornecedoras do Instituto, responsável por serviços como limpeza e lavanderia.

Alessandro disse que devolvia 33% do valor que recebia pelos serviços por mês. Ele contou que chegou a entregar para Priscila Coutinho, sócia de Mouhamed Mustafa, a quantia total de cerca de R$ 10 milhões.

A terceira ré foi Priscila Marcolino Coutinho. Ela não respondeu a nenhuma pergunta e se reservou ao direito de permanecer calada.

Ao fim dos depoimentos, Jabur comentou sobre as afirmações feitas pelos réus.

“Eu acho que a gente avançou bastante na busca pela verdade. Tanto a colaboradora Jennifer, quanto o Alessandro confirmaram os fatos que nós colocamos na denúncia e isso vem a corroborar a acusação. Então nós entendemos que os fatos que foram apurados trouxeram mais robustez para nossa tese de acusação”, completou.

No primeiro dia de interrogatório, o depoimento do médico Mouhamed Mustafa foi adiado para a esta sexta-feira (17), após problemas na escolta policial dele para o Fórum Ministro Henoch Reis, em Manaus.

O caso

O médico Mouhamad Moustafa, apontado como chefe de uma esquema de desvio de verbas na saúde pública no Amazonas, teve o patrimônio multiplicado 88 vezes de 2012 a 2015. As informações são de investigações da operação “Maus Caminhos”, deflagrada pela Polícia Federal no dia 20 de setembro.

O montante desviado na fraude ultrapassa R$ 112 milhões. O dinheiro era utilizado na aquisição de bens de alto padrão, como avião a jato e shows particulares de bandas famosas no país.

A investigação que apontou a existência da fraude iniciou a partir de uma análise da CGU sobre a concentração atípica de repasses do Fundo Estadual de Saúde ao Instituto Novos Caminhos (INC), que é uma organização social sem fins lucrativos.

Segundo a PF, o grupo utilizava uma entidade social – no caso, o Instituto Novos Caminhos – para fugir dos procedimentos licitatórios regulares e permitir a contratação direta de empresas prestadoras de serviços de saúde administradas, direta ou indiretamente, por Mouhamad Moustafa.

De acordo com informações obtidas pelo G1, as fraudes nos serviços públicos de saúde do Estado do Amazonas propiciavam aos envolvidos no esquema uma vida luxuosa.

O esquema

As investigações constataram que o Instituto Novos Caminhos (INC) concentrava repasses vultosos feitos pelo Fundo Estadual de Saúde do Estado do Amazonas. De abril de 2014 a dezembro de 2015 foram repassados ao INC mais de R$ 276 milhões.

Em análise feita pela CGU foi constatado que o INC recebeu R$ 153 milhões a mais para a gestão de 165 leitos de baixa complexidade que o Hospital e Pronto-Socorro 28 de Agosto aplicou para a gestão de 378 leitos de alta complexidade.

A partir de então, foi identificada uma série de fraudes nos contratos de serviços de saúde, que ocorriam pela contratação de empresas comandadas direta ou indiretamente pelo médico e chefe da organização investigada, Mouhamad Mostafa.

Ele é sócio-administrador da Salvare Serviços Médicos Ltda e da Sociedade Integrada Médica do Amazonas Ltda (Simea), e controlava ainda a Total Saúde Serviços Médicos e Enfermagem Ltda, por meio de procuração emitida pela presidente do INC.

Ele realizava articulações junto ao governo para obter acesso às verbas públicas de saúde e, assim, conseguir as liberações de pagamentos junto às secretarias de governo.

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